18.5.14

Curiosidades da Língua Portuguesa (4ª edição)

Curiosidades da Língua Portuguesa 
4ª Edição

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(1)
HISTORIA DE “GENTE”, DE “IRMANDADE”, DE “GENEROSIDADE” 
Tudo o que existe tem a sua história. Assim acontece também com as palavras. Elas surgem, evoluem umas e regridem outras, estratificam aqui e promovem-se ali, ou então instalam-se comodamente na Língua de um Povo. Qual ser vivo, as palavras associam-se em famílias e, dumas e doutras, vamos ocupar-nos… deliciosamente! 
Quem é que, à primeira, é capaz de pensar que “generosidade” é da mesma família de “gente” e de “irmandade”? 
Comecemos então por “gente”. Tem origem no latim “gens” que designava o “conjunto de pessoas com um antepassado comum”.Por regra, um cidadão romano tinha três elementos no seu nome e este referia-se à “gens” a que pertencia. Por exemplo Júlio César pertencia à “gens Julia”. 
“Gente” passou a significar “a raça, a nação, o povo de um país”. De “gente” derivaram gentio, gentil e outras palavras. Ambas as palavras tinham o sentido inicial de “nativo, natural”, mas, com o tempo, gentio passou a ter o sentido depreciativo de “bárbaro, inculto, pagão”, ao contrário de gentil, que passou a significar “nobre, cavalheiresco, elegante, belo”, sentido bem patente em “gentileza”. 
Notamos assim que palavras com o mesmo sentido original passaram a ter sentidos opostos. Veja-se o contraste de sentido em frases como: “Esse fulano não tem o mínimo de maneiras! Não passa de um gentio! “Tu foste muito gentil em convidares-me para a tua festa. Agradeço a tua gentileza” Quanto a “irmandade”, é palavra derivada de irmã que remete para a ligação de uma pessoa a outra pelo sangue. “Irmão” provém do adjectivo “germanu”- “o que é da mesma raça”, que por sua vez provém de “germen” - , palavra que está na origem dos nossos vocábulos “gérmen” e “germe”, “origem, rebento descendência”. Assim, irmão, irmã, irmandade pertencem a uma vastíssima família de palavras de que registamos génio, engenho, ingénuo, genial, gerar, género, genital, eugenia, eugenismo, genuíno, genealogia, generoso, generosidade, degenerar, regenerar, para além das já mencionadas gente, gentio, gentil. 
“Génese” e “eugenia” são palavras da mesma raiz de “gente” mas que provém do grego. “Génese” significa “origem, ponto de partida”. É por isso que a Bíblia começa com o Génesis, ou seja o livro que tem por início a narração da criação do mundo. 
“Eugenia” é a ciência de aperfeiçoar a raça humana por meio de cruzamentos de indivíduos seleccionados. Tomada neste sentido, foi sempre objecto de condenação pela doutrina da igreja, por ir de encontro à dignidade e direitos dos seres humanos, baseados na lei natural. No entanto, há um conjunto de medidas que são recomendáveis pelo eugenismo ou pela ou pela eugenética, sempre que se trate de reduzir ao mínimo o número de indivíduos deficientes, por exemplo a proibição do matrimónio a consanguíneos ou a doentes mentais. 
A propósito de eugenia, é de lembrar que os nomes próprios Eugénio e Eugénia significam, literalmente, o (a) bem nascido (a), ou o (a) que tem uma boa origem. 
Com “irmandade” está relacionada a palavra “fraternidade”, palavra esta da família de “frei, freire, freira, frade, fraterno, fraternal, confrade, confraria, fratricídio e outras. Em latim os vocábulos para “irmão” e “irmã” eram, respectivamente, “frater” e “soror” e, por isso, uma “confraria” é sinónimo de “irmandade”, e um membro de uma ordem religiosa é tratado por “frade, frei, freire, ou irmão”, e a freira é “sóror ou irmã”. 
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(2)
As palavras aplicadas à remuneração de serviços são diversas e a maior parte delas traz consigo marcas de sentido curiosas e até conotações dignas de atenção. 
Comecemos pela mais humilde: a “jorna”. Do latim “diurna” derivam, por via popular, “jorna” e, por via erudita, ”diurna”. Ambas as palavras se reportam ao sentido de dia. “Jorna” tem a ver com o trabalho diário no campo, portanto o jornaleiro é o que é remunerado por um dia de trabalho. Assim, “andar à jorna” é o mesmo que “andar a dias”. Com a debandada dos campos e a mecanização do trabalho agrícola, o “jornaleiro” – o trabalhador agrícola – foi-se tornando cada vez mais raro. Hoje uma pessoa que trabalha a dias mas não na agricultura como, por exemplo, uma empregada doméstica, já não é apelidada de jornaleira. 
De “jorna”, derivam também “jornal” palavra que se emprega no mesmo sentido de “jorna”, mas raramente, e no sentido de publicação periódica, quase exclusivamente. A designação de “jornal” provém do facto de originariamente a publicação ser diária. Nesta perspectiva, “jornal” era o mesmo que “diário”. Depois “jornal” evoluiu de sentido para “noticiário” de imprensa, rádio, televisão), ou “edifício onde se faz um jornal”. Também o trabalhador do jornal já não foi designado por jornaleiro mas sim por “jornalista” com o sentido, exclusivamente, de profissional da comunicação social.
 “Diurna” é o feminino de “diurno” e o seu sentido manteve-se idêntico ao etimológico: o que é diário ou feito de dia. Neste sentido, “diurna” opõe-se a nocturna, feita de noite. 
Não menos interessante é a remuneração designada por “salário”. Deriva de “salariu”-que era a “ração diária de sal” dada na antiga Roma aos escravos. Mas nos tempos modernos, com o desenvolvimento do comércio e da indústria, a palavra aplicou-se à remuneração dos trabalhadores da indústria, do comércio e dos outros sectores de serviços para lá do trabalho agrícola. 
Assim, estes trabalhadores são assalariados mas a sua remuneração já não é em sal e recebem ao mês e não ao dia. O seu estatuto remuneratório é articulado por negociações salariais. O sal foi substituído por numerário ou dinheiro. Numerário está relacionado etimologicamente com “nummum”, “moeda”, e “dinheiro” teve origem em “denarium”, palavra que deu também “denário”. Dinheiro é “qualquer moeda de metal ou papel que representa um valor fixado por lei”. O denário era uma moeda romana e como moeda se manteve entre nós até ao século XVI. 
Outra palavra para designar a remuneração é “soldo”, proveniente, por via popular, de “solidum”, no significado de denso, inteiro. Passou no latim tardio a significar uma moeda de oiro e no século XV já se empregava com o sentido de ordenado, vencimento, especificamente o dos militares. Como moeda, o soldo referia-se à “região de que provinha ou ao metal de que era feito”: soldo leonês /de leão), soldo borgonhês (da Borgonha), soldo áureo (de ouro). 
Da família de soldo e sólido são solda, soldar, soldada e soldado. À situação presente interessa uma referência às palavras soldada e soldado. “Soldada” é a quantia com que é pago o trabalho dos criados, operários, etc. 
Soldado veio por via francesa (soldat) e significa, literalmente, o que está ao serviço, o que recebe soldo, o defensor. São ocorrentes expressões como soldados da paz, soldado raso, soldado recruta, soldado pronto e soldado desconhecido. A remuneração do soldado pronto, também designado por praça era, a par com soldo, o “pré”, outra palavra que nos chegou por via francesa. 
Passemos a outra palavra: o “ordenado”. A palavra era inicialmente um adjectivo verbal de ordenar, pôr em ordem. No âmbito específico da linguagem religiosa significa “aquele que recebeu a ordenação sacerdotal, o sacramento da Ordem”. Passou depois à classe de substantivo com o sentido de salário, remuneração, vencimento. 
“Vencimento” é, literalmente, o acto de vencer. É uma palavra rica em expressividade porque lhe subjaz a ideia do esforço pessoal para alcançar uma vitória: a compensação ou remuneração desse esforço. Na prática passou, quanto ao sentido, a equivaler a ordenado, salário, remuneração. “Remuneração” é um nome mais genérico que salário e vencimento pois, para além do sentido de pagamento de um serviço, significa também gratificação, honorário, galardão, o que equivale a dizer que significa tanto a recompensa como a dádiva. 
Um tipo específico de remuneração é a “avença”, palavra que já era usada na Idade Média para os cobradores de impostos da Coroa e que passou a designar a “quantia certa a pagar periodicamente por quem recebe um serviço ou fornecimento, seja qual for a importância ou frequência dele, em substituição da retribuição por acto prestado ou unidade fornecida”. 
Finalmente, outro modo de remunerar são os “honorários”, palavra que é um substantivo derivado do adjectivo honorário. Entre o adjectivo e o substantivo o sentido é quase contrário, porque “honorário” é o que possui a honra de um cargo sem os respectivos proventos ou encargos materiais, e “honorários” constituem a remuneração pecuniária por serviços prestados por profissionais que, geralmente, exercem profissões liberais. 
De todas as palavras enumeradas, jorna, salário, vencimento, soldo, e honorários, são as que tiveram um percurso histórico mais errante ou sentido mais rico. Sob o aspecto da hierarquização social, jorna restringiu-se à área agrícola sendo, portanto, a mais humilde; salário, ordenado, vencimento abrangem operários, trabalhadores do comércio e serviços, funcionalismo público em geral; honorários aplicam-se a advogados, médicos, arquitectos, solicitadores, engenheiros, enquanto profissionais liberais. 
Remuneração, ordenado, vencimento são talvez as palavras cujo sentido é mais transversal à sociedade.

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(3)
Comer, Beber, Conviver “
As conversas são como as cerejas” ou “palavra puxa palavra”são expressões que costumamos utilizar para referirmos que uma ideia faz lembrar outra ideia e constitui uma boa razão para se prolongar uma conversa até …nunca mais acabar. E é o que acontece com: Comer, beber e conviver. 
Todos sabemos que o instinto de sobrevivência é satisfeito pela comida e pela bebida. Porém, a maior parte das pessoas não come e bebe apenas para sobreviver: buscam na comida e na bebida algo que lhes dê prazer. E, quando o prazer se torna exagerado, estamos a confrontar-nos com a gula, palavra que em latim significa boca, garganta, goela. Assim, a gula é o prazer da goela, e é este o sentido dos derivados guloso, gulodice, guloseima. 
O prazer da comida e da bebida tem dimensão não só individual, mas também colectiva: as pessoas gostam de comer e beber acompanhadas, isto é, em convívio. Aliás o sentido original de convívio é o de refeição, festim, portanto, o convívio é composto por dois elementos: a comida ou bebida, e a cordialidade, sendo que foi a cordialidade que veio a prevalecer no convívio. 
Quem come em excesso é um comilão ou glutão, e quem ingere exageradamente bebidas alcoólicas é um bêbedo ou bêbado. A moral social desaprova este tipo de comportamentos e critica-o em tom quer de seriedade, quer de sátira, e daí o grande número de palavras ou expressões de que a linguagem informal dispõe para caracterizar aqueles comportamentos. O comilão é um alarve, um alambazado, uma frieira, um esganado, um lambareiro, um guloso, um lambão, um rapa-tachos, etc.. 
O bêbedo é um borracho, um beberrão, uma esponja, um bebedola ou bebedolas, um beberrote, está grosso; apanha pielas, roscas, piteiras, pifos, etc.. Da família de convívio são conviver, convivência e conviva. Convivência e conviver remetem para ambientes familiares ou de amizade, enquanto conviva significa também o convidado, isto é, a pessoa que participa num banquete. 
Com a mesma raiz de conviva temos várias palavras como vida, viver, vital, vitalidade, avivar, aviventar, revitalizar, desvitalizar, redivivo, vivificar, vivência, sobreviver, sobrevivência, bem como nomes próprios ou apelidos: Vital, Vitalino, Vidal, Vidas. 
O acto de comer e beber é genericamente designado por refeição, palavra da família de refazer e refeitório. Assim, a refeição é a acção em que os seres vivos se refazem. Refeitório é, literalmente, o espaço ou local em que as pessoas tomam a sua refeição, mas o uso da palavra actualmente reporta-se a um número relativamente vasto de convivas. 
Passemos ao nome das refeições e aos respectivos conceitos. Começando pelo desjejum, trata-se da saída do jejum, ideia indicada pelo prefixo des. Na linguagem popular é designado por mata-bicho, palavra cheia de sentido, por sugerir que o bicho é a fome ou a sede, que são mortas pela comida ou bebida. O desjejum ou mata-bicho são referidos pela maior parte dos utentes da língua por pequeno-almoço, pequena refeição tomada às primeiras horas da manhã. Ao pequeno-almoço seguem-se o almoço, o lanche ou a merenda, o jantar e a ceia. 
A palavra almoço parece ter tido o sentido original de pedaço ou bocado que se morde ou trinca. Por isso é que, na linguagem popular, o acto de comer e a própria comida são referidos por trincadeira e, se a pessoa não ingere comida de qualidade e em quantidade suficiente, é apelidada de «trinca-espinhas», ou «tira-linhas», em virtude da sua magreza. 
Até ao último quartel do século passado, o almoço no mundo rural era tomado no meio da manhã e o jantar – a refeição principal – ocorria às primeiras horas da tarde. 
Lanche é um estrangeirismo: provém do inglês lunch, com o sentido de «refeição ligeira». Corresponde ao piquenique, outro estrangeirismo aportuguesado, com a diferença de que o lanche se reporta ao ambiente doméstico, enquanto o piquenique ocorre em ambiente ao ar livre, e um e outro têm significado próximo de merenda, palavra que ocorre mais frequentemente nos meios populares e que tem a mesma raiz do verbo merecer. Assim sendo, a merenda é, ou era, literalmente, a recompensa em comida e bebida pelo trabalho feito. Da família de merenda são merendar, merendeira, «o pão próprio para a merenda», merendeiro, «o cesto em que se leva a merenda». No passado, em certas regiões, a merendeira, feita de farinha de milho e açúcar, recheada de passas de figo e pedaços de noz, era parte integrante do folar que os afilhados recebiam dos seus padrinhos pela Páscoa. Em algumas regiões do mundo rural havia ainda o merendico, «refeição que se servia a meio da manhã, durante os trabalhos das segadas (ceifas) ou das malhadas, (debulhadas)».
O jantar designava, entre os Romanos, a refeição do meio-dia, (o jentaculum) correspondente ao nosso almoço. O jantar, entre as pessoas que viviam da vida no campo, ocorria às primeiras horas da tarde, ao ar livre e à sombra do arvoredo na época estival, a que se seguia o repouso da sesta, no período do dia em que o calor é mais intenso. Com as transformações operadas no trabalho agrícola, este costume entrou em declínio e a paisagem rural alterou-se substancialmente. E já que falamos em sesta, convém esclarecer que se trata da forma popular de sexta, a hora que na sociedade romana correspondia aproximadamente ao meio-dia. A ceia, (do latim cena), era a refeição principal dos Romanos, correspondente ao nosso jantar. Entre nós, no mundo rural, a ceia era tomada às primeiras horas da noite, antes do deitar, variando o horário de acordo com as estações do ano. Assim, no Inverno ceava-se bastante cedo, ao contrário do Verão, porque as pessoas viviam ao ritmo do nascer e pôr do Sol. As pessoas ceavam, faziam a oração da noite, lavavam os pés e em seguida iam para a cama. Porém, nos meios relacionados com actividades comerciais ou industriais, quando o trabalho se prolonga para além do horário normal, é frequente haver uma ceia. 
Com a comida ou bebida têm a ver (e não têm a haver!!!) termos que actualmente remetem para sentidos muito diferentes tais como cenáculo e simpósio mas…veremos isso no próximo mês. 
E porque de comer se trata, terminemos hoje com uma boa sardinhada: 
Sardinha à descrição? 
Com frequência se vê nos restaurantes publicidade à prestação de serviços e produtos de modo a cativar os clientes e consequentemente a aumentar a receita do estabelecimento. 
Gramaticalmente, descrição é um substantivo comum, do género feminino, do número singular. Significa exposição exacta e viva de um facto, lugar ou paisagem, por meio de palavras ou escrita; narração; enumeração. Discrição é um substantivo comum, do género feminino, do número singular. Significa qualidade de discreto; reserva; modéstia; segredo; prudência. Na locução adverbial “à discrição” quer dizer “à vontade”, “sem restrições”. 
Então, quando se pretende comunicar que o cliente pode comer sardinha sem restrição, deve dizer-se “SARDINHA À DISCRIÇÃO e não “sardinha à descrição”. 
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(4) 
…METER A MISSIVA, MÍSSIL, MISSA E MISSÃO (1)
A quantos de nós já passou pela cabeça que os verbos admitir, arremeter, arremessar, cometer, demitir, emitir, intermitir, intrometer, omitir, permitir, prometer, remeter, submeter, transmitir, e os nomes missa, missal, missão, míssil, missionário, missiva, premissa têm todos a mesma raiz do verbo simples meter? 
“Meter” provém do verbo latino “mittere”, cujo significado é “lançar, deixar partir, atirar”. Mas também já no latim o verbo significava “pôr de lado, mandar, escrever, dedicar, produzir”. 
Através de um grande número de prefixos e de alguns sufixos, o verbo “meter” deu origem a um campo de palavras muito amplo, tanto quanto ao número de palavras como quanto à respectiva significação. 
Por meio do prefixo ad – formaram-se admitir, admitir, admissão, admissibilidade. Admitir significa geralmente “aceitar”, e por isso admissível é o que é aceitável, admissão é o mesmo que aceitação, admissibilidade é a condição ou qualidade de aceitação. Acrescentando a admitir o sufixo re-, temos as palavras readmitir e readmissão, em que o prefixo tem o sentido de repetição. Assim, readmitir é tornar a aceitar. Ao lado de readmitir (de re + ad) temos arremeter. Da família de arremeter são, entre outras, as palavras arremetida, arremesso, arremessar. Arremeter é o acto de se lançar contra algo ou alguém, o mesmo que atacar, mas arremessar, arremesso e arremetida têm também conotação valorativa. Assim, arremessar-se é ”atirar-se com destemor”, aventurar; arremesso e arremetida são atitudes corajosas. É frequente o emprego da expressão”arma de arremesso” para designar a atitude que alguém toma com vista a determinado objectivo, numa acepção semelhante à de “atirar à cara” ou “lançar em rosto”. 
Acrescentando a meter o sufixo com temos palavras como cometer, comissário, comissionista, comissão, cometimento, comité. Cometer é sinónimo de “praticar” ou “executar”, muito frequente em frases como “cometer um crime”. Mas significa igualmente “dar” ou “delegar” e daí uma comissão ser um encargo, uma incumbência de carácter temporário. São frequentes expressões como “comissão de serviço, comissão executiva, comissão parlamentar, comissão parlamentar de inquérito”. Uma comissão de serviço é exercício de um cargo por um período limitado; uma comissão executiva é o conjunto de pessoas que executam as decisões tomadas pelos membros dum grupo; uma comissão parlamentar é um grupo de trabalho que elabora propostas para serem apresentadas à Assembleia Parlamentar; uma comissão parlamentar de inquérito é um grupo de membros da Assembleia encarregado de realizar um inquérito a um escândalo, uma catástrofe, uma denúncia de corrupção, etc. Por exemplo, o acidente de Camarate, que tirou a vida a Sá Carneiro e seus acompanhantes já teve várias comissões parlamentares de inquérito. Ente nós, lamentavelmente, estas comissões acabam por chover no molhado, mas isso é outra história… 
Comissão emprega-se também para referir a retribuição que é dada pelo comitente, o que incumbe alguém, ao comissionado, o que é incumbido, isto é, recebe uma comissão. 
Comissário é, em geral, o que exerce uma comissão com carácter temporário. Em certas profissões designa quer um nível na carreira profissional, quer a própria profissão. Na PSP há a patente de comissário; na aviação, o comissário de bordo tem a função de prestar apoio aos passageiros. Nos antigos territórios ultramarinos houve comissários régios no séc. XIX, nomeados por decreto real, com poderes superiores aos dos governadores-gerais. 
 Comissionista é quem recebe comissão por uma tarefa realizada. Cometimento é cometer ou praticar um acto que geralmente comporta risco, e daí significar também “aventura”, “empreendimento”. 
Foi através da língua francesa que nos chegou a palavra comité (cremos que absolutamente desnecessária porque equivale a “comissão,” “junta”). Logo a seguir ao 25 de Abril tivemos a dirigir os destinos do país uma “Junta de Salvação Nacional (e não um comité).Mas a palavra sobreviveu. Na política, o órgão principal do Partido Comunista é o seu Comité Central. 
Acrescentando a cometer o prefixo a-, temos as palavras acometer, acometida, acometimento. Nestas palavras domina a ideia de adversidade, oposição, ataque. Daí significar também o “acto de afectar” em frases como “ser acometido por doença fatal”. 
Por meio do prefixo de- há as palavras demitir, demissão, demissionário, e por meio do prefixo e- temos emitir, emissor, emissora, emissão, emissário. 
Em demitir, demissão, demissionário o prefixo de- confere o sentido de movimento para baixo e daí “deixar cair”, abater”. Emprega-se usualmente com o sentido abstracto de “despedir ou despedir-se”. Demissionário é quem pediu a demissão, isto é, quem renunciou a um cargo ou função. 
Em emitir, emissor, emissão, emissário, emissora, o prefixo e- indica “movimento para fora”. Assim, emitir é o acto de soltar, deixar sair (um som, um sinal, uma luz); emissor é quem emite ou envia. Na comunicação oral ou escrita, o emissor é quem transmite os sinais (sonoros ou escritos) à pessoa ou pessoas que os recebem (os receptores). Emissora é a estação de rádio ou televisão que emite sinais sonoros ou audiovisuais, ou a empresa que produz programas de rádio ou televisão. Emissário é quem vai em missão, o mesmo que mensageiro ou arauto. A palavra passou a designar também a parte da rede sanitária ou pluvial que vai dar ao local de escoamento. 
Com o prefixo entre- temos, entre outras, as palavras entremeter, entremetimento, que não são de emprego usual e com as quais está relacionada entremez, nome dado na literatura medieval, a uma peça teatral de cunho jocoso que era representada no entreacto (ou no meio) de outra peça. 
Com o prefixo inter – há intermitir, intermissão intermitência. O prefixo confere ao verbo meter o sentido de interrupção temporária. Assim, a intermissão é uma interrupção ou suspensão. Na sinalização luminosa, a luz intermitente é, literalmente, a que tem suspensões, isto é, ora acende ora apaga. 
Na linguagem da medicina, intermitência aplica-se quer à descontinuação no desenvolvimento duma doença, quer à perda de um ou mais batimentos cardíacos. Saramago – o violador da Língua Portuguesa e prémio Nobel da Literatura – deu a uma das suas obras o título de “As Intermitências da Morte”. 
Entrementes, fazemos aqui um intervalo e prometemos voltar.